Lembro-me
como se fosse hoje e já tantos anos passaram por cima daquele primeiro dia
assustado. Não conhecia nada nem ninguém. Sozinho numa cidade que não era a
minha. Longe do conforto da minha casa. Distante, tão distante, dos cuidados
dos meus pais. Comigo só tinha uma certeza, o curso. Era aquele. Sempre foi.
Direito!
Eu, ao
contrário de muitos, queria ter ficado na minha terrinha, mesmo sabendo que
isso não era sequer opção. Sempre fui pouco aventureiro. Não queria ruas, nem gentes
que eu não conhecia. Obrigado a isso, lá fui, temeroso e de malas feitas para a
cidade Invicta.
O caloiro
atravessou os portões da universidade de olhos postos em tudo, tendo como
principal objetivo passar despercebido. Coisa difícil para quem é novato. Devia
sentir-se ao longe o cheiro de estreante, mesmo que este fosse de jornal
dobrado, metido por baixo do braço, a dar um ar de homem adulto e batido. O
sossego durou trinta minutos. Os “doutores” interpelaram-me e deram início à
minha praxe. Bastante tranquila por sinal. Aceitei-a de braços abertos, usei-a
para conhecer colegas e amigos, alguns deles que ainda hoje guardo comigo.
Gente para a vida! Tenho comigo que a praxe parte dos “doutores”, mas deve ser
definida pelos caloiros. O caloiro não tem, não deve, nem pode aceitar tudo.
Deve, isso sim, aproveitar o que de melhor ela tem para oferecer,
estabelecendo-lhe sempre limites. Se assim for é perfeito e essencial para
todos os que estão a começar a sua vida académica.
O
equilíbrio que a vida estudantil exige nem sempre está ao alcance de um
adolescente com dezassete, dezoito ou dezanove anos. Por mim falo. Faltou-me o
equilíbrio. As noites pareciam-me mais fáceis que os dias. Os bares
suportavam-se bem melhor que as aulas. As discotecas era sítios bem mais
agradáveis que a biblioteca. Tudo era melhor quando o sol se punha. Era melhor
porque eu me desequilibrei. Sozinho numa cidade grande, que tanto tinha para me
oferecer e eu sem capacidade para lhe dizer não. O tempo passou e eu nem conta
dei. Esqueci-me dos livros e das aulas. Perdi a noção da realidade, do que era
importante e, isso é o mais importante, perdi a noção de que há tempo para
tudo.
Esta é
uma nota que merece um parágrafo. Há tempo para tudo. Há tempo para as aulas,
há tempo para estudar, há tempo para os amigos, há tempo para as jantaradas, há
tempo para os copos e há tempo para as noitadas. Só de pensar que em maio
estava de férias e só voltava em setembro ou outubro. Três ou quatro meses de
férias. É muito tempo de boa vida! E para estudar são apenas duas alturas do
ano, três no máximo, vá, se a coisa correr mal.
Ser
universitário é atingir o ponto alto de uma carreira, a de estudante. É ir mais
além nos estudos. É tocar na ponta da pirâmide académica. É um tempo que deve ser
sentido e vivido, passa num instante e deixa saudades, acreditem. Aproveitem a
praxe, selecionem os amigos, cresçam enquanto seres “independentes”, porque nas
universidades os encarregados de educação não assinam folhas, e organizem o
vosso tempo. Formem-se enquanto alunos, mas não se esqueçam de se formarem
enquanto seres humanos.
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