O ciclismo não é, de todo, o meu desporto de eleição. Gosto da envolvência e das chegadas ao sprint. O resto não me diz nada. O pedalar de dezenas de homens que não conheço durante horas a fio para mim significa zero. Muito sinceramente.Contudo, e mesmo não sendo um amante do ciclismo, eu adorava o Lance Armstrong. Eu queria comprar o livro dele. Via-o como um exemplo, um lutador nato, em cima da bicicleta e na vida. Ele venceu um cancro e depois disso venceu sete voltas à França. Era impossível não admirar um homem destes.Quem gosta da vida e do desporto levantava-se para aplaudir Armstrong. Ele não era um exemplo apenas no ciclismo, ele era um exemplo para o mundo. Dentro e fora do desporto. No arquivo onde estava o nome deste ciclista estão nomes como o de Michael Jordan, Ayrton Senna, Pete Sampras e Pelé, por exemplo, e lá irão entrar nomes como o Tiger Woods, Kobe Bryant, Messi e Federer, entre outros. São os chamados predestinados. Nasceram com um dom e naquilo que fazem são, em tudo, superiores aos outros.
Eu adorava e eu admirava o Lance Armstrong. Os verbos estão no pretérito e de lá não vão sair. Pelo menos para mim. Já não o adoro, nem o admiro. Pior que eu estarão, de certeza, os amigos, os familiares e os fãs que o defenderam sempre, e que, como o seu filho, sempre disseram que o que se dizia sobre ele era mentira. O ciclista americano viu esta bola de neve a começar e a crescer a uma velocidade louca, viu os que o amam e os que lhe querem bem a entrar nela por ele. Viu tudo isto e, sentado num egoísmo sem medida, deixou andar. Preferiu desfrutar da falsa fama que tinha e usar o que de bom sentiam por ele para se proteger. Isso é feio, é muito feio.
Agora, depois do próprio ter assumido que se dopou, inclusive em todas as suas sete vitórias francesas, e que tinha o esquema de dopping mais sofisticado da história do desporto, há quem venha para a praça pública dizer que todos os outros também o fazem. Quanto a isto é importante que se diga que ninguém sabe se os outros o fazem ou não. Até que o provem, ao contrário de Armstrong, eles são todos inocentes. Por fim, e mais importante, o que fazia a diferença entre o americano e os demais era precisamente isso. Ninguém duvidava dele, ele era especial, ele venceu o cancro, ele venceu sete voltas à França, ele era muito melhor que os outros, ele tinha um dom. No mundo existiam dois tipos de ciclistas: o Armstrong e os outros. Agora não! Agora, pelos vistos, todos os ciclistas são uns dopados. Isto não é mais nem menos que tentar fazer do acto de terrorismo desportivo uma coisa banal. Com esta confusão toda quem acabou por cair foi a classe do ciclista. Isto tem lógica? Não tem, porra!
O Lance Armstrong dopou-se, viciou resultados, mentiu ao desporto e aos seus amantes, enganou os que, de uma maneira ou de outra, lhe são próximos e viveu, à grande e à francesa, durante anos a fio à custa de uma farsa. Isto não se faz e ponto final. Nenhum desportista o deve fazer, muito menos alguém com o tamanho mediático dele.
A confissão tem sempre o meu aplauso, seja em que situação for, mas infelizmente não resolve nada. A do ciclista, na minha óptica, serviu para lhe tirar um peso na cabeça, para sacudir a pressão que já lhe devia esmagar o peito, e, acredito, para ganhar muito dinheiro. Desculpem-me, mas duvido que ele não tenha tido qualquer proveito económico com esta confissão pública.
Armstrong será sempre recordado, fará eternamente parte da história do desporto, mas infelizmente os motivos nunca serão merecedores de aplausos. Ele será o alarme das falsidades desportivas e graças a ele, a partir de agora, qualquer humano se sentirá no direito de duvidar dum predestinado.
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