sexta-feira, 18 de junho de 2010

Manifestação contra Marinho Pinto

Como muitos de vós já saberão, foram divulgados (oficialmente) hoje, dia 17 de Junho de 2010, osresultados do infame exame nacional de acesso ao estágio de advocacia.
Contudo, antes que os mesmos tivessem sido disponibilizados no site da OA (na véspera), foram divulgadas as estatísticas à comunicação social: 90% de chumbos. Assim se pretendia semear o pânico naqueles que realizaram os exames e se visava obter o apoio das massas que associam juristas a deputados e advogados corruptos e que imediatamente formularam uma opinião: é bem feito.

Imediatamente surgiram comentários às notícias no site do Público do seguinte teor:

- "Que grandes cábulas esses licenciados que chumbaram no exame. Ahahahahahahahah. Entram nas universidades e andam a colecionar cadeiras para quê? Ca buuuuuuuuuurrrrroooossssssss!!!"

- "jà não era sem tempo

que se começa a ter algum critério na profissão de advogado,que está recheada de vigaristas e aldrabões sem nenhuma ética,muitos dos quais estão mais vocacionados para carteiristas do que para advogacia.Falo por experiência propria porque já fui espoliado e enganado por vários destes "doutores de trazêr por casa".Força Marinho Pinto,pena é que não se tenham aplicado medidas dessas nos que se foram infiltrando nos últimos trinta anos."

- HAHAHAHAHA

"Cambada de burros, pensam que um bacharelato é suficiente, hahahhahhahahhhahahhahahhahahha, vão mas é estudar e acabar o mestrado, já não chega os burros da privada, pensarem que são gente, hahahhaha, especialmente aqueles que compr....tiraram uma média "alta"


Em suma, com a prévia informação da comunicação social das notas dos exames, semeava-se a instantânea ideia nos menos informados de que finalmente alguém estava a fazer o que era preciso. Finalmente alguém acabava com os advogados corruptos e mal preparados. Finalmente, Marinho Pinto.


Diz o Bastonário: "Entendemos que essas pessoas formadas com 3 e 4 anos pelo processo de Bolonha, não têm os conhecimentos de Direito necessários para exercer a profissão"

Antes de mais, cumpre notar que o Bastonário coloca no mesmo saco os licenciados de 3 e 4 anos, tomando como irrelevante a existência de mais ou menos um ano em cada um dos casos. Porque não fazer o mesmo com os licenciados de 4 e 5 anos então?

De seguida há que referir que, se a duração do curso é critério de qualidade, então o Sr.Bastonário será sem dúvida uma das pessoas mais qualificadas do país, uma vez que demorou quase uma década a concluir o seu curso. Ah nesse tempo esteve a lutar contra as "tiranias do Estado novo"? Contra as constantes violações dos direitos dos cidadãos e inclusivamente dos alunos? E agora que está do outro lado mantém coerência que propugna?

Caso a resposta a esta questão seja afirmativa, então pergunto como é que concilia a prévia divulgação dos resultados aos exames à comunicação social em vez de aos alunos e a sua posição quanto às "vergonhosas violações" do segredo de justiça na imprensa?


Chama-nos de "bacharéis travestidos de licenciados", de "esses senhores dos cursos de 3 e 4 anos", de "falsos licenciados", não nos reconhece categoria para ingressar numa Ordem representada por si, mas cabe então perguntar de onde vem essa superioridade científica, intelectual e académica que se arroga? Da licenciatura que obteve após o 25 de Abril, naquela bandalheira das passagens administrativas?


Há pouco disse o Bastonário que «a esmagadora maioria dos que querem entrar na Ordem queriam era ser juízes e procuradores e não conseguiram porque não estavam bem preparados». Pois bem, não só tenho a certeza que o Sr.Bastonário não tem quaisquer dados estatísticos para fazer semelhante afirmação, como considero isso insultuoso para mais de metade da classe que representa.

Além do mais, como é que pode dizer que os recém-licenciados de Bolonha não entram na Ordem porque não têm qualidade e de seguida afirma que esses mesmos licenciados - antes de terem tido oportunidade de tentar sequer seguir as carreiras que afirma serem a sua primeira escolha - apenas querem ingressar na OA porque não conseguiram seguir as outras carreiras? Acabámos de nos licenciar mas já falhámos na tentativa de entrar para o CEJ?


«E como a Ordem tem tido as portas abertas, queriam entrar. Não pode ser, têm de estar bem preparados. Hoje não basta ter um diploma, é preciso ter conhecimentos. Porque os diplomas degradaram-se», lamentou.". E antigamente bastava ter um diploma sem conhecimentos? E quais são os dados de que dispõe para afirmar que os licenciados de Bolonha não têm conhecimentos e, consequentemente, que V.Exa. tem mais conhecimento do que eles? O exame recentemente realizado? Proponho então o seguinte: aquando da realização do próximo exame, será V.Exa. submetido a um exame feito nos mesmos moldes, mas por Professores de Direito - insusceptíveis de serem influenciados por V.Exa. - e o seu exame será sujeito a critérios de correcção semelhantes aos do exame de 30 de Março.


Esta política de "eugenia académica" e penalização dos licenciados de Bolonha simplesmente pelo facto de terem tirado o curso depois dos restantes advogados substitui a exigência de um critério lógico de selecção por um critério cronológico.


E já veio o Bastonário ameaçar que, caso seja declarada ilegal com força obrigatória geral a exigência de exame de acesso, então passará a exigir que os candidatos apresentem o mestrado concluído para ingressarem na ordem.

Ora vejamos as consequências disto: o licenciado de Bolonha concluirá o curso em 4 anos, tirará o mestrado em 2 e, caso esse mestrado seja o científico, então a tese demorará necessariamente mais tempo a ser corrigida, o que levará a uma duração mínima de 3 anos de mestrado. Após ingressar no estágio, o candidato terá de estagiar durante 2 anos e meio para, por fim, ser advogado. Portanto, o processo de Bolonha implicará que quem quer ser advogado tenha de passar por um processo de selecção e avaliação de 9 anos e meio. Parece-lhe razoável? Talvez pareça, uma vez que foi o tempo que demorou a tirar a licenciatura, mas nem todos nós temos paciência para ir trabalhar para jornais enquanto tentamos seguir a profissão que V.Exa. ilegal e inconstitucionalmente nos veda.


Acrescento ainda que, não só é ilegal (como aliás já foi reconhecido pelo Tribunal Administrativo de Lisboa) a imposição do referido exame, como a correcção do mesmo violou o próprio regulamento que o instituiu (ou que instituiu a Comissão Nacional de Avaliação). Basta ver que o art. 16º nº1 do Regulamento da Comissão Nacional de Avaliação prevê a correcção das provas no prazo de 30 dias, salvo deliberação em contrário (a qual não houve ou, caso tenha havido, nunca foi comunicada).

Ora, entre a data de realização das provas e a apresentação dos resultados decorreram cerca de 78 dias.


Poderíamos ainda referir a anedótica publicação de uma grelha de correcção com uma solução e subsequente substituição por outra (estando, neste momento, em minha posse ambos os exemplares para quem os quiser), facto que deixa no ar a dúvida acerca da existência de "critérios previamente definidos pela CNA" que servirão de base à "correcção e classificação das provas escritas" (cfr. art. 15º do RCNA) e de qual dos dois terá sido utilizado para a correcção. Mas já se me afigura como desnecessário insistir naquilo que é óbvio para todos menos para si Sr. Bastonário: este exame é um absurdo.


Veremos se V.Exa. continuará no atropelamento de normas legais e regulamentares que tem vindo a protagonizar e se também fará tábua rasa do art. 188º doEstatuto da Ordem dos Advogados, que impõe que o estágio tenha início "duas vezes em cada ano civil".


Sr.Bastonário, V.Exa. não tem categoria para representar estes "bacharéis" e questiono até que tenha conhecimentos jurídicos superiores aos de grande parte daqueles que chumbaram.


Dia 2 de Julho pelas 15 horas apareça à janela da sede da Ordem dos Advogados sff. Se tudo correr como planeado terá à sua porta os licenciados que ainda hoje acusou de passividade face às medidas da ordem.


Cumprimentos,



Pelos licenciados de Bolonha,


O Legislador Ordinário.


Retirado do Legislador Ordinário.

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